A cada amanhecer, o frio da manhã na face, o gosto do mate amargo na boca e um novo destino pela frente.
Demorou a abandonar, momentaneamente, as fotografias, os mapas das cavalgadas rascunhados, os papeis e os recortes de jornais amarelados pelos anos. Toda a sua referência está naqueles pedaços de memória, que ele não quer e não pode se desvencilhar. Nosso palco: as antigas instalações da, tão sua, Marahé Doces.
“Na Semana Farroupilha, a cultura é muito pouca. É mais o festejo. Compram uma roupa, se vestem de gaúchos e já pensam que são gaúchos. Ser gaúcho não é isso” – desvia o olhar como quem se transporta para dentro de si: “Ser gaúcho, na essência, é você se adaptar ao sistema de um povo forte, que sobreviveu (às intempéries do tempo).”
Era 28 de dezembro de 1942 quando nasceu o meu (contestador) personagem de hoje, na cidade de Erechim (RS). Amante de “O Tempo e o Vento”, de Érico Veríssimo, tanto do livro quanto da minissérie, Natal José Silvani é um dos fundadores e o segundo patrão do CTG Vaqueanos do Oeste, criado em 1979, e idealizador da 1ª Cavalgada da Integração, de 1986, e das duas seguintes.
Em cada lugar, uma sesteada. Mais de 300 quilômetros foram percorridos na primeira vez, de Chapecó a Soledade (RS), passando por mais de dez cidades, em 14 dias de viagem; a segunda, foi de Chapecó a São Miguel do Oeste e a terceira de Chapecó a Espumoso (RS). “Às vezes vejo os vídeos das cavalgadas e fico pensando: como conseguimos fazer isso, numa época tão diferente?” Antes das empreitadas, Natal pedia aos companheiros que levassem o mínimo de objetos possível, para que não lembrassem do rancho, como no gauchismo é chamada a casa.
“O gaúcho de hoje, não é o gaúcho primitivo. Descendemos de riograndenses, imigrantes de europeus. Antes, havia o gaúcho que não conhecia a lei: a lei era ele quem fazia. Não tinha fronteiras, lambrado, cerca. Um povo que surgiu do nada, que surgiu do próprio chão, como um vegetal, uma árvore, uma vida”, se reporta o senhor, conhecedor da arte de criar pássaros, que crê que a tradição, quando bem cultuada, é uma religião.
As cavalgadas tentam lembrar o que e como os antepassados viviam. A cada amanhecer, o frio da manhã na face, o gosto do mate amargo na boca e um novo destino pela frente. Nas “viajadas”, sentem a liberdade que o povo gaúcho sentia, desde o primeiro grito no escuro até o último. “Sempre digo para a minha gurizada: ‘vocês já viram o amanhecer como é lindo?’”, duvida. “Minha gente (os antepassados) faziam cavalgadas para conquistar áreas de terra; nós fazíamos isso em nome da paz. Pela confraternização do ser humano, pela cultura do Sul do país, de parte do Paraguai, do Uruguai e da Argentina.”
Apegado à cultura nativa, à raiz, à cepa, conta que, mesmo que haja uma desavença entre os gaúchos, isso não impede que tomem um mate juntos, antes de tudo. “Primeiro se toma o mate, depois se discute os problemas.” Diz que a maioria das pessoas não sabe porque usa lenço ou bombacha ou porque está fazendo a homenagem da Semana Farroupilha. “Quando tiram a roupa, já não são mais gaúchos”, observa.
Ele fez parte de um movimento, que hoje mostra os seus reflexos. As cavalgadas, que tanto cresceram, deixaram uma enorme saudade de outros tempos e trouxeram a ele muito conhecimento. “O gaúcho autêntico é aquele que irmana a vida dele em um outro ser que também gosta de tomar um mate, contar uns causos, fazer fogo de chão, sair para o campo, conhecer. A essência do gaúcho é a fraternidade, a conquista do ser humano; não com guerra ou bagunça, mas com amizade.”
“Bueno Tche!
Venho de novamente bater na porta do teu rancho,
Pra tu não ir de carancho
O patrão me deu este encargo,
Enquanto tomo um mate amargo
Na conversa de mano a mano
Sou peão lá dos Vaqueanos
Aonde se peala de cuchara
Alise bem tuas garras
De bota espora e mango
Traga a china e os piazitos
Prá dançar neste Fandango”...
“Na Semana Farroupilha, a cultura é muito pouca. É mais o festejo. Compram uma roupa, se vestem de gaúchos e já pensam que são gaúchos. Ser gaúcho não é isso” – desvia o olhar como quem se transporta para dentro de si: “Ser gaúcho, na essência, é você se adaptar ao sistema de um povo forte, que sobreviveu (às intempéries do tempo).”
Era 28 de dezembro de 1942 quando nasceu o meu (contestador) personagem de hoje, na cidade de Erechim (RS). Amante de “O Tempo e o Vento”, de Érico Veríssimo, tanto do livro quanto da minissérie, Natal José Silvani é um dos fundadores e o segundo patrão do CTG Vaqueanos do Oeste, criado em 1979, e idealizador da 1ª Cavalgada da Integração, de 1986, e das duas seguintes.
Em cada lugar, uma sesteada. Mais de 300 quilômetros foram percorridos na primeira vez, de Chapecó a Soledade (RS), passando por mais de dez cidades, em 14 dias de viagem; a segunda, foi de Chapecó a São Miguel do Oeste e a terceira de Chapecó a Espumoso (RS). “Às vezes vejo os vídeos das cavalgadas e fico pensando: como conseguimos fazer isso, numa época tão diferente?” Antes das empreitadas, Natal pedia aos companheiros que levassem o mínimo de objetos possível, para que não lembrassem do rancho, como no gauchismo é chamada a casa.
“O gaúcho de hoje, não é o gaúcho primitivo. Descendemos de riograndenses, imigrantes de europeus. Antes, havia o gaúcho que não conhecia a lei: a lei era ele quem fazia. Não tinha fronteiras, lambrado, cerca. Um povo que surgiu do nada, que surgiu do próprio chão, como um vegetal, uma árvore, uma vida”, se reporta o senhor, conhecedor da arte de criar pássaros, que crê que a tradição, quando bem cultuada, é uma religião.
As cavalgadas tentam lembrar o que e como os antepassados viviam. A cada amanhecer, o frio da manhã na face, o gosto do mate amargo na boca e um novo destino pela frente. Nas “viajadas”, sentem a liberdade que o povo gaúcho sentia, desde o primeiro grito no escuro até o último. “Sempre digo para a minha gurizada: ‘vocês já viram o amanhecer como é lindo?’”, duvida. “Minha gente (os antepassados) faziam cavalgadas para conquistar áreas de terra; nós fazíamos isso em nome da paz. Pela confraternização do ser humano, pela cultura do Sul do país, de parte do Paraguai, do Uruguai e da Argentina.”
Apegado à cultura nativa, à raiz, à cepa, conta que, mesmo que haja uma desavença entre os gaúchos, isso não impede que tomem um mate juntos, antes de tudo. “Primeiro se toma o mate, depois se discute os problemas.” Diz que a maioria das pessoas não sabe porque usa lenço ou bombacha ou porque está fazendo a homenagem da Semana Farroupilha. “Quando tiram a roupa, já não são mais gaúchos”, observa.
Ele fez parte de um movimento, que hoje mostra os seus reflexos. As cavalgadas, que tanto cresceram, deixaram uma enorme saudade de outros tempos e trouxeram a ele muito conhecimento. “O gaúcho autêntico é aquele que irmana a vida dele em um outro ser que também gosta de tomar um mate, contar uns causos, fazer fogo de chão, sair para o campo, conhecer. A essência do gaúcho é a fraternidade, a conquista do ser humano; não com guerra ou bagunça, mas com amizade.”
“Bueno Tche!
Venho de novamente bater na porta do teu rancho,
Pra tu não ir de carancho
O patrão me deu este encargo,
Enquanto tomo um mate amargo
Na conversa de mano a mano
Sou peão lá dos Vaqueanos
Aonde se peala de cuchara
Alise bem tuas garras
De bota espora e mango
Traga a china e os piazitos
Prá dançar neste Fandango”...
(Trecho de um convite-poema escrito por Natal José Silvani, declamado durante a entrevista com o sotaque carregado e inconfundível do gaúcho)
(Publicado no Voz do Oeste em 7 e 8 de setembro de 2010)
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