É a festa dos santos na rua. Mas santos que são parte de uma natureza bem mais humana. Ou seria desumana?
Lore acordou às 4h45 na segunda-feira, pós-eleições. Ao chegar às 7h nas ruas, seu lugar de trabalho, seus pés alvoroçavam santinhos de todos os tipos. “Acho isso um absurdo. É só isso que eu sei dizer. É um absurdo. Sabe quando você leva aquele choque? Não é justo.” Até pouco depois das 10h, ela já havia limpado toda a sujeira que encontrou pelo caminho, assim como suas colegas de serviço. Todas, infiltradas em uma missão impossível: limpar a cidade toda, tomada por santos.
Para Lore, essa não é a festa da democracia, mas a festa da sujeira. É a festa dos santos na rua. Mas santos que são parte de uma natureza bem mais humana. Ou seria desumana? José é um dos que dizem ser esse um comportamento desumano. José trabalha em uma empresa encarregada de limpar a sujeira alheia. Ele é líder, mas limpa a sujeira de outros líderes.
O mar de santinhos foi uma das primeiras coisas que viu ao acordar, logo após às 4h. Antes das 5h, já estava recolhendo santinhos. Seu lugar de trabalho é uma grande universidade e, apesar da vergonha de ter que limpar o mar das divindades, se sente responsável pela limpeza do espaço, para que os alunos possam chegar à universidade sem se assustarem com a cena que lhe chocou.
“O que os alunos vão dizer da gente?” Com essa ideia em mente, fez o possível para dar conta do recado, mesmo que tivesse que arranhar asfaltos ou se embrenhar nas capoeiras para tirar os santinhos impregnados. José conta que nas escolas da cidade, a situação era ainda pior.
“Sofri muito essa manhã. Com a chuva, ficou ainda pior de juntar os santinhos. Enfrente aos blocos, estava feio. Falam tanto a respeito de cidade limpa, em preservar o meio ambiente. Eu estava pensando nessa manhã: acho que isso deveria mudar. Chega a época das eleições e não existe mais como limpar tanta sujeira.”
Naquela instituição, outro senhor é encarregado da limpeza nos locais em que estava a maior parte dos santinhos. Mas José fez uma boa ação, já que a idade do senhor encarregado é avançada e José julgou que poderia ajudá-lo em um momento como esse, de trabalho intenso – pelo menos para os homens e as mulheres da limpeza.
- Será que quem jogou esses santinhos está trabalhando agora? Pergunto. Ouço um “duvido” vindo de longe, dito por outro indignado. “Quem ganhou está comemorando”, fala José, crendo que deveria haver uma lei que proibisse os santinhos, jogados de sacoladas durante as campanhas. Sacoladas, recolhidas pelas mãos de pessoas como Lore e José, que não fazem as leis, mas que se submetem a elas, sendo elas humanas ou não.
Um comentário:
“Propaganda é a alma do negócio”
E a sujeira ainda nem começou,
a das ruas é só amostra grátis...
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