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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Voa, Tuba!

Foram dias incomuns, desde aquela pergunta: “Você soube do Tuba?” Da resposta que eu não sabia qual era até a resposta que ouvi, foram minutos intermináveis. Foram dias duros. O tempo se moveu diferente, mais lento e pesado, desde aquele dia. Doze de janeiro de dois mil e onze, dois meses antes de Fabrício de Oliveira Tubin completar 29 anos, o “baquetas voadoras” nos deixou. Esse é o primeiro “Identidades” póstumo e, se é, é porque se trata de uma vida que valeu a pena.
Por anos e anos ele nos cativou ao som de suas baquetas voadoras, com seu entusiasmo único, com seu quase-transe em palco, em bandas como The Hempsons, Bauretes Quizofônicos e Epopeia. Agora, bandas em luto, guardam um vazio que não poderá mais ser preenchido pela presença barulhenta em palco e silenciosa fora dele, mas não menos inquieta.
Vi chorando quem sempre via sorrindo, ouvi homenagens sonoras saírem de gargantas em pedra, pessoas que até então se espalhavam em mesas diferentes e distantes, reunidas em um grande e mesmo brinde, pisando em solo sagrado depois de sete dias. Por um instante, todos saíram de suas clausuras para compartilhar um momento de união na dor, dor pelo adeus a um amigo querido, lenda entre os chegados. Pensávamos que ele seria eterno.
A mãe, dona Neiva, diz que Fabrício, gaúcho orgulhoso nascido em Canoas, se transformou após a descoberta dos óculos. O menino tímido, passou a sentir uma espécie de poder atrás das lentes, que o acompanharam a vida toda. Foi o primeiro do Bom Pastor a por brinco na orelha. Aos treze, ganhou uma bateria. Desde então, seu ritmo foi o de vôo. Longe dos pratos, a boca permanecia escancarada e as mãos agitadas em baquetas imaginárias.
O pai, Luiz, o acompanhava em sua rotina longe das baquetas, na tentativa de trabalhar do jeito “sério”, dando força para que ele seguisse em frente. Tuba até tentou, estudou jornalismo, história e turismo, mas optou por não concluir nenhum dos cursos. Além da bateria, dos discos de vinil e dos CDs, outra de sua paixão era dirigir, também o Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense e a Chapecoense.
Para Marciano Maraschin, amigo, fã e músico, Tuba era “o legítimo debulhador”, o melhor baterista desde 1977. Os amigos da banda Epopeia, entendem que Tuba apenas era, não precisava se proclamar. Na bateria, nenhum show era igual ao outro. Tinha pegadas autorais, estilo, e ficou na história, como Tony Batera, do lendário Grupo Nozes. Contam que Snoopy, um cofap que morreu recentemente com 17 anos, era companheiro inseparável de Tuba. Noopy era o quinto elemento da Epopeia.
Freqüentador assíduo do Bar da Dulce, para ela, Tuba deixará somente boas lembranças. Dulce era conhecida como a segunda mãe do baterista, pois sempre estava preocupada em saber se ele tinha comido, se estava bem, o que ele tinha para dizer. Dulce diz que com ela, Tuba falava. Suas madrugadas eram compartilhadas e ela se admirava ao ouvir papos sérios noites a fio.
Depois de anos apresentando complicações nos rins, em 2011 o quadro se agravou. Fez hemodiálise, mas não adiantou. Do rim, a complicação atingiu também o fígado. Tuba teve falência múltipla dos órgãos. Alguns suspeitaram de leptospirose, mas essa não é uma hipótese aceita pela família. Nem mesmo os médicos conseguiram compreender o quadro, muito menos revertê-lo.
O último show do ano de 2010 da Epopeia, em 3 de dezembro no Morrison Rock’n Blues Bar, também foi o último de Tuba, que já apresentava cansaço. Era para ser o show de despedida da vocalista Eliz, que foi passar uma temporada no litoral catarinense, mas acabou sendo também o show de despedida de Tuba. Eliz não pôde vir para o oeste para se despedir do amigo e companheiro de palco, que teve orgulho em partilhar com ele, mas acompanhou tudo de longe através dos integrantes da banda.
Nessas horas, palavras são inúteis. Até quem sempre sabe o que dizer, se rende aos clichês em horas como essa. Mas que essas poucas palavras, esse emaranhado de signos, sirva para registrar a trajetória desse baterista que fez arte com as baquetas nas mãos, que voou longe e cedo demais.
Quem o olhava nos olhos, via um amigo. Via a alegria e a tristeza de ser o que sentia. Tuba criou asas e voou, se separou da máscara mundana e deixou uma mensagem de desapego, de negação aos estereótipos, aos moldes sociais que sufocam. Sempre gentil, porém forte, fez o que quis, viveu como escolheu viver.
Com ouvidos mais atentos, quem sabe possamos ouvir esse grande personagem do rock chapecoense ao lado de seus ídolos, como Keith Moon e Jimmy Hendrix, espalhando saudades enquanto corta o ar com suas lendárias baquetas em pleno vôo.

“Você não sabe há quanto tempo
Estou aqui
Esperando a hora certa
De partir

Partir o bolo
Queimar dinheiro
Sair do jogo
Volt(ar)ei a viver”

(Epopeia – Quando Criamos Asas e Voamos)

3 comentários:

Renata Oliveira disse...

oi Fabi, meus pésames. nem há o que dizer.

mas saiba que gosto daqui, e tem selo lá no meu blog pra ti ! abração, fica bem.

rekiyomaro.blogspot.com

Ariel Fernando disse...

Belo texto, bela homenagem. Pena que me fez chorar... a dor no peito bate... e a saudade do amigo é prá sempre.

Liza disse...

Obrigado por tudo querida amiga!
bjs Liza & Epopeia.