quantas semanas já se passaram? eu não sei. parei naquele dia e os dias seguintes foram apenas de esperas e lembranças. tenho me censurado por isso, por tudo. tenho pensado em cada frase, separando sílaba por sílaba dos teus sinais. tenho pensado em mim e no que me bloqueia, em todo esse medo do porvir. tenho pensado no que seria melhor, você voltar ou nunca mais. e nessa linha do tempo que estico e disseco, sou vítima e carrasco de mim. e tu, amor cruel, homem infiel, mecanismo propulsor de toda a minha infelicidade, és ainda o que me mantém viva. como o previsto, me encheu de esperança e eu te enchi de vida e agora, longe, sinto que me tatuei em ti sem querer e aguardo teus retornos do lado de fora.
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terça-feira, 29 de dezembro de 2009
sábado, 26 de dezembro de 2009
Clarice Lispector - Infelicidade Inspiradora
Clarice Lispector amou o romancista Lúcio Cardoso, homossexual, e o cronista Paulo Mendes Campos, que era casado. As paixões impossíveis alimentaram sua literatura - e ela não foi a única escritora a se nutrir do fracasso amoroso
Por José Castello
A paixão alimenta a literatura ou a enfraquece? Amar leva a escrever ou a calar? Clarice - A Vida de Clarice Lispector, biografia do jornalista norte-americano Benjamin Moser - que chega neste mês ao Brasil com o status de ser a mais completa sobre a autora de Laços de Família e Felicidade Clandestina —, sugere que, mesmo quando o amor é impossível, ele estimula a escrita. Mesmo fracassado, um amor pode ajudar a escrever.
Casada entre 1943 e 1959 com o diplomata Maury Gurgel Valente, Clarice nunca escondeu que se sentia sufocada pela vida conjugal. "Nada tenho feito, nem lido, nem nada. Sou inteiramente Clarice Gurgel Valente", escreveu em uma carta datada de 1944. Se o casamento com Maury "deu certo" - gerou dois filhos e perdurou por 16 anos - a paixão pelo romancista mineiro Lúcio Cardoso foi muito mais importante para sua escrita, mesmo "dando errado".
Quando se conheceram, em 1940, Clarice tinha 20 anos, e Lúcio - brilhante e sedutor -, 28. Mas era um amor impossível: Lúcio era um homossexual assumido. Havia, porém, lembra Moser, um segundo impedimento: os dois eram "parecidos demais". Mesmo assim, especula Moser, foi esse amor não correspondido que levou Clarice a cultivar a solidão - condição essencial para a escrita. Mais que isso: foi o fracasso no amor que a empurrou para a literatura. Por meio de Lúcio, ela passou a frequentar as rodas literárias do "grupo introspectivo", que se reunia no Bar Recreio, no Rio de Janeiro. Chegou, assim, à poesia metafísica de Augusto Frederico Schmidt e encontrou sua ascendência "mística" em Cornélio Penna e Octavio de Faria, essenciais para a sua obra. Foi Lúcio Cardoso quem sugeriu o título de seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem (1943). Foi ele, ainda, quem lhe mostrou que as anotações dispersas, que ela tomava às tontas e pareciam incoerentes, eram, na verdade, o seu método.
Nos anos 60, Clarice Lispector se aproximou de outro escritor: o cronista e poeta mineiro Paulo Mendes Campos. Desde 1959 estava separada de Maury, com quem tinha morado na Itália, Suíça e Estados Unidos. Em junho daquele ano, regressou com os dois filhos ao Brasil, apostando novamente na solidão. Em 1962, porém, envolveu-se com Paulo.
Diz Moser, com astúcia, que ele foi uma "versão heterossexual" de Lúcio Cardoso. Ambos eram mineiros, católicos, talentosos e sedutores. Eram também perdulários, boêmios e alcoólatras. Como Lúcio, Paulo exerceu uma forte influência intelectual sobre Clarice. Mas era outro amor impossível: ele era casado. Mesmo assim os dois viveram uma paixão secreta. Vínculos invisíveis os ligavam. O jornalista Ivan Lessa assim resumiu: "Em matéria de neurose, nasceram um para o outro". Clarice tentava ser discreta, mas não continha a ansiedade. Intimado pela mulher, Paulo partiu com a família para Londres. Moser avalia que o fim do romance isolou Clarice do meio literário e, de um modo mais geral, do "mundo adulto", com o qual ela teve sempre laços muito frágeis. Ela o amou até o fim de seus dias.
Casada entre 1943 e 1959 com o diplomata Maury Gurgel Valente, Clarice nunca escondeu que se sentia sufocada pela vida conjugal. "Nada tenho feito, nem lido, nem nada. Sou inteiramente Clarice Gurgel Valente", escreveu em uma carta datada de 1944. Se o casamento com Maury "deu certo" - gerou dois filhos e perdurou por 16 anos - a paixão pelo romancista mineiro Lúcio Cardoso foi muito mais importante para sua escrita, mesmo "dando errado".
Quando se conheceram, em 1940, Clarice tinha 20 anos, e Lúcio - brilhante e sedutor -, 28. Mas era um amor impossível: Lúcio era um homossexual assumido. Havia, porém, lembra Moser, um segundo impedimento: os dois eram "parecidos demais". Mesmo assim, especula Moser, foi esse amor não correspondido que levou Clarice a cultivar a solidão - condição essencial para a escrita. Mais que isso: foi o fracasso no amor que a empurrou para a literatura. Por meio de Lúcio, ela passou a frequentar as rodas literárias do "grupo introspectivo", que se reunia no Bar Recreio, no Rio de Janeiro. Chegou, assim, à poesia metafísica de Augusto Frederico Schmidt e encontrou sua ascendência "mística" em Cornélio Penna e Octavio de Faria, essenciais para a sua obra. Foi Lúcio Cardoso quem sugeriu o título de seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem (1943). Foi ele, ainda, quem lhe mostrou que as anotações dispersas, que ela tomava às tontas e pareciam incoerentes, eram, na verdade, o seu método.
Nos anos 60, Clarice Lispector se aproximou de outro escritor: o cronista e poeta mineiro Paulo Mendes Campos. Desde 1959 estava separada de Maury, com quem tinha morado na Itália, Suíça e Estados Unidos. Em junho daquele ano, regressou com os dois filhos ao Brasil, apostando novamente na solidão. Em 1962, porém, envolveu-se com Paulo.
Diz Moser, com astúcia, que ele foi uma "versão heterossexual" de Lúcio Cardoso. Ambos eram mineiros, católicos, talentosos e sedutores. Eram também perdulários, boêmios e alcoólatras. Como Lúcio, Paulo exerceu uma forte influência intelectual sobre Clarice. Mas era outro amor impossível: ele era casado. Mesmo assim os dois viveram uma paixão secreta. Vínculos invisíveis os ligavam. O jornalista Ivan Lessa assim resumiu: "Em matéria de neurose, nasceram um para o outro". Clarice tentava ser discreta, mas não continha a ansiedade. Intimado pela mulher, Paulo partiu com a família para Londres. Moser avalia que o fim do romance isolou Clarice do meio literário e, de um modo mais geral, do "mundo adulto", com o qual ela teve sempre laços muito frágeis. Ela o amou até o fim de seus dias.
TENSÃO E LOUCURA
É sempre ambígua e tensa a relação amorosa entre escritores. Influenciada pela filosofia de Jean-Paul Sartre, com quem viveu uma relação heterodoxa, Simone de Beauvoir acreditava que todo amor é impossível, mas que era possível fazer muito de seus destroços. Só porque via o amor como uma experiência desastrosa, Simone conseguiu amar Sartre: não moravam juntos, não tiveram filhos e namoravam outras pessoas. Ele mais que ela. "Não somos a mesma pessoa, mas temos as mesmas recordações", Simone argumentava. Tinha certeza de que, escrevendo, ajudava Sartre a entender quem ele era.
Às vezes, como mostra a relação dos poetas Paul Verlaine e Arthur Rimbaud, a mistura de literatura e paixão resvala na loucura. Quando se aproximaram, Verlaine, um homem casado, tinha 26 anos, e Rimbaud era um rapazote de 17. Correspondiam-se. Apaixonaram-se. Verlaine se embriagou com as ideias de Rimbaud, que combatia os parnasianos, a família e a pátria. Na busca do "desregramento dos sentidos", abusaram do absinto e do haxixe. Mas brigavam sempre. Verlaine se arrependia sempre. "Volte, volte, amigo. Juro que serei bom", escreveu em carta de 1873. Numa dessas brigas, Verlaine feriu Rimbaud com um tiro no punho. Passou dois anos na prisão. A paixão os destruiu, mas ampliou os limites de sua poesia.
A mistura de amor e literatura tomou uma forma quase perfeita na figura da escritora Lou Andreas-Salomé. Brilhante e sensual, ela "devorou" o espírito de três grandes homens: o poeta Rainer Maria Rilke, o filósofo Friedrich Nietzsche e o fundador da psicanálise, Sigmund Freud. Foram amores distintos - que ela, friamente, chamava de "experiências". Com Rilke, ela viveu uma paixão intensa que esbarrou na fraqueza do poeta. Aos poucos, Lou entendeu que a poesia era, para ele, o avesso do desespero. Ficou com o melhor - o poeta - e se afastou do homem. Pragmática, escreveu: "Se você quer uma vida, aprenda a roubá-la".
Mesmo quando bordeja o desespero, a paixão sustenta a literatura. Casada em 1912 com o escritor Leopold Woolf, nem o amor salvou Virginia Woolf. Na base da paixão de Leopold por Virginia estava não só o fascínio por sua escrita, mas o desejo de salvá-la da loucura - que enfim, no ano de 1941, levou-a a afogar-se no rio Ouse. A admiração literária e o amor não garantiram a felicidade. Mas a fizeram escrever.
Também é impossível não pensar no poeta britânico Ted Hughes, cujo amor foi insuficiente para salvar a mulher, a norte-americana Sylvia Plath, do suicídio - que ela enfim cometeu em 1963. Um ano antes, cansado, Hughes a deixou. Tantas e tantas vezes a paixão não basta. Mas a importância de Hughes na poesia de Sylvia é indiscutível.
Mesmo quando se torna asfixiante, a paixão não anula a escrita. O caso entre os americanos F. Scott Fitzgerald e Zelda Sayre é uma prova disso. Em carta de 1920, Zelda escreve ao amado: "Eu jamais poderia passar sem você - ainda que me deixasse morrer de fome e me espancasse". A presença esmagadora de Scott não a impediu de escrever um belo romance como Esta Valsa É Minha, de fundo autobiográfico. Já em sua vida pessoal, o amor não lhe bastou. Em 1930, demonstrando a insuficiência da paixão para sustentar uma vida, Zelda foi internada como louca.
Nem todos, como o argentino Adolfo Bioy Casares, tiveram a sorte de transformar a parceria amorosa - no caso, o casamento com a escritora Silvina Ocampo - em fecunda parceira literária. Juntos, escreveram Quem Ama, Odeia, novela simples, mas inspirada, que resume um pouco não só os paradoxos da paixão, mas as relações tensas, porém produtivas, entre amor e literatura.
Adolfo e Silvina são, provavelmente, uma exceção. Mesmo quando fracassa, porém, um amor pode salvar um escritor.
Às vezes, como mostra a relação dos poetas Paul Verlaine e Arthur Rimbaud, a mistura de literatura e paixão resvala na loucura. Quando se aproximaram, Verlaine, um homem casado, tinha 26 anos, e Rimbaud era um rapazote de 17. Correspondiam-se. Apaixonaram-se. Verlaine se embriagou com as ideias de Rimbaud, que combatia os parnasianos, a família e a pátria. Na busca do "desregramento dos sentidos", abusaram do absinto e do haxixe. Mas brigavam sempre. Verlaine se arrependia sempre. "Volte, volte, amigo. Juro que serei bom", escreveu em carta de 1873. Numa dessas brigas, Verlaine feriu Rimbaud com um tiro no punho. Passou dois anos na prisão. A paixão os destruiu, mas ampliou os limites de sua poesia.
A mistura de amor e literatura tomou uma forma quase perfeita na figura da escritora Lou Andreas-Salomé. Brilhante e sensual, ela "devorou" o espírito de três grandes homens: o poeta Rainer Maria Rilke, o filósofo Friedrich Nietzsche e o fundador da psicanálise, Sigmund Freud. Foram amores distintos - que ela, friamente, chamava de "experiências". Com Rilke, ela viveu uma paixão intensa que esbarrou na fraqueza do poeta. Aos poucos, Lou entendeu que a poesia era, para ele, o avesso do desespero. Ficou com o melhor - o poeta - e se afastou do homem. Pragmática, escreveu: "Se você quer uma vida, aprenda a roubá-la".
Mesmo quando bordeja o desespero, a paixão sustenta a literatura. Casada em 1912 com o escritor Leopold Woolf, nem o amor salvou Virginia Woolf. Na base da paixão de Leopold por Virginia estava não só o fascínio por sua escrita, mas o desejo de salvá-la da loucura - que enfim, no ano de 1941, levou-a a afogar-se no rio Ouse. A admiração literária e o amor não garantiram a felicidade. Mas a fizeram escrever.
Também é impossível não pensar no poeta britânico Ted Hughes, cujo amor foi insuficiente para salvar a mulher, a norte-americana Sylvia Plath, do suicídio - que ela enfim cometeu em 1963. Um ano antes, cansado, Hughes a deixou. Tantas e tantas vezes a paixão não basta. Mas a importância de Hughes na poesia de Sylvia é indiscutível.
Mesmo quando se torna asfixiante, a paixão não anula a escrita. O caso entre os americanos F. Scott Fitzgerald e Zelda Sayre é uma prova disso. Em carta de 1920, Zelda escreve ao amado: "Eu jamais poderia passar sem você - ainda que me deixasse morrer de fome e me espancasse". A presença esmagadora de Scott não a impediu de escrever um belo romance como Esta Valsa É Minha, de fundo autobiográfico. Já em sua vida pessoal, o amor não lhe bastou. Em 1930, demonstrando a insuficiência da paixão para sustentar uma vida, Zelda foi internada como louca.
Nem todos, como o argentino Adolfo Bioy Casares, tiveram a sorte de transformar a parceria amorosa - no caso, o casamento com a escritora Silvina Ocampo - em fecunda parceira literária. Juntos, escreveram Quem Ama, Odeia, novela simples, mas inspirada, que resume um pouco não só os paradoxos da paixão, mas as relações tensas, porém produtivas, entre amor e literatura.
Adolfo e Silvina são, provavelmente, uma exceção. Mesmo quando fracassa, porém, um amor pode salvar um escritor.
José Castello é escritor e jornalista, autor de A Literatura na Poltrona, entre outros.
(Revista Bravo - Novembro/2009)
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
não sei se são os insetos de verão, o calor ou o asco que sinto de ti, mas não consigo dormir. parece que adivinha, parece estar em sintonia. asco sim, raiva. por que não desiste? eu já desisti. já corri atrás de ti, pena ao vento; já te flagrei, vadias aladas nas noites da cidade. não ligue, não vou atender. não vou te ver, não te direi como chegar. meu templo é sagrado, nele não entram criaturas como tu. se achas que podes invadir minha janela com esse cheiro de rua, estás bem enganado. teu hálito etílico, tuas indecisões e promessas, tuas renúncias e arrependimentos, teus delitos, testemunhos vagos, doloridos...
esqueça. eu esqueci.
contradição & mentira.
sábado, 12 de dezembro de 2009
la negra, 4/5 de outubro de 2009
deixe que venha o quiser escorrer dessa rosa negra, la negra rosa da fronteira. já estou do outro lado, mercedes sosa, morta, canta pra mim. rapazes fronteiriços, hospedaje 24h, sir phillip morris no cinzeiro improvisado. compro meu ópio em pesos. cortinas floridas que dão para o asfalto feito de lunas falsas. todos os países têm seus ídolos pré-fabricados. todo o amor é feito solitário. aventuras perpétuas em castelhano falado em altas velocidades. lembro de meu pai. nossa última viagem foi para bernardo de irigoyen. gasosas, framboesas, garapas & tomates. longas esperas no chevette marrom metálico. meu pai, selvagem do asfalto, cachimbos, mavericks & noviças. ouvia perla e pegava a estrada, ao lado da loura fatal que era mi madre. fronteiriços como eu. amantes, como nós. ironia. destino. porra nenhuma. cachorros sem dono, cão e cadela. lençóis surrados, poeira, suor e cerveja. eles se encontravam sem pronunciar palavra alguma em orelhões movediços. se achavam pelo cheiro, pela exuberância das formas disformes, das couraças de aura escandalosa. (cante mais, sosa, cante). o cio inevitável, a morte prematura, um novo caminho, praia ou paraguay, abortos humanos, nós. experiências que não deram certo. por que eu nasci? por que de ti? as velhas banheiras passam velozes & capengas. interrompem meu sono tardio. quero morrer como tu, sosa. em guerra com os pulmões, nas malvinas argentinas.
pelo menos até às 5h45.
adios, “la negra” sosa.
(tirado do diário poético "stereo")
pelo menos até às 5h45.
adios, “la negra” sosa.
(tirado do diário poético "stereo")
espaços
como guardar um espaço para mim
nos teus dias claros, meu amor?
como livrar-me de todos esses dramas
de todos esses traumas, sem que hajam
mortos & feridos dentro desse ser?
o inverno chegou tão de repente
quase não pude notar seus passos lentos
veio & invadiu meus sonhos mais tranqüilos
enquanto eu dormia o sonho dos puros
“será que você ainda pensa em mim?”
já tentei te odiar, mas eu sempre volto atrás
fico só, whisky sem gelo, no meu leito, o gato
que ronrona pacientemente enquanto lhe nego carinho
um lugar, uma vaga intransferível, é tudo o que peço
nos teus olhos, entre as tuas mãos, dentro de ti
no teu peito, um canto do teu abraço, um sorriso simples
ao final do dia, quando a noite cai levando minhas defesas
quando tudo parece perdido, diluído num infinito infernal
uma esquina do teu beijo, a um passo da tua boca
tua respiração quente & lenta, tua voz calma
a falar coisas sem sentido que me fazem rir
teu corpo, teu vinho, tua alma, teu ninho
você inteiro a fundir-se a cada parte de mim.
nos teus dias claros, meu amor?
como livrar-me de todos esses dramas
de todos esses traumas, sem que hajam
mortos & feridos dentro desse ser?
o inverno chegou tão de repente
quase não pude notar seus passos lentos
veio & invadiu meus sonhos mais tranqüilos
enquanto eu dormia o sonho dos puros
“será que você ainda pensa em mim?”
já tentei te odiar, mas eu sempre volto atrás
fico só, whisky sem gelo, no meu leito, o gato
que ronrona pacientemente enquanto lhe nego carinho
um lugar, uma vaga intransferível, é tudo o que peço
nos teus olhos, entre as tuas mãos, dentro de ti
no teu peito, um canto do teu abraço, um sorriso simples
ao final do dia, quando a noite cai levando minhas defesas
quando tudo parece perdido, diluído num infinito infernal
uma esquina do teu beijo, a um passo da tua boca
tua respiração quente & lenta, tua voz calma
a falar coisas sem sentido que me fazem rir
teu corpo, teu vinho, tua alma, teu ninho
você inteiro a fundir-se a cada parte de mim.
O abandono
O abandono está nas ruas
Cheias de boas idéias
O que foi meu e o que foi teu
O que foi útil, retrátil, volátil
Frágil, stereo, imperecível
Pois a mesma mão que acolhe
É a mão que abandona
O abandono é o avesso da vida
Mas o que seria a vida
Senão abandono e aconchego?
As cidades, o concreto
São corpo-vivo do abandono
A idéia lançada e não aceita
Consentida por mera educação
Toda ali, abortada, morta-viva
A espera de um impulso
Da mesma mão que acolhe
E rejeita, apega e desapega
O abandono está nas ruas
Mas o que é o abandono
Senão apenas aquilo ou aquele
Que é deixado ao sabor da sorte
Sem mais explicações
Delongas ou milongas?
Cheias de boas idéias
O que foi meu e o que foi teu
O que foi útil, retrátil, volátil
Frágil, stereo, imperecível
Pois a mesma mão que acolhe
É a mão que abandona
O abandono é o avesso da vida
Mas o que seria a vida
Senão abandono e aconchego?
As cidades, o concreto
São corpo-vivo do abandono
A idéia lançada e não aceita
Consentida por mera educação
Toda ali, abortada, morta-viva
A espera de um impulso
Da mesma mão que acolhe
E rejeita, apega e desapega
O abandono está nas ruas
Mas o que é o abandono
Senão apenas aquilo ou aquele
Que é deixado ao sabor da sorte
Sem mais explicações
Delongas ou milongas?
vai ser melhor te ver partir do que te ver chegar. a chuva que agora me molha e estremece amanhã me acalmará. da próxima vez não sairei correndo na tempestade, da próxima vez não será teu rosto que estarei procurando entre as lágrimas de sal. decido te tirar do jogo, carta marcada. sou a dona do jogo, sou outra e outra e outra. minha história escrevo sem tua sombra, meu conto terá outro personagem. (a tela fria, luminosa, me ofende. lousa em branco ansiosa pela tinta negra do meu insight, meu mar de acordes tempestuosos.) vai, se você precisa ir. vai e não volte. me envolvo nessa malha impermeável, o sol bate e eu aspiro o calor que queima. odeio verão. odeio esses dias e as chuvas passageiras. e agora te odeio. vou ler poemas ao luar e esperar pelo inverno. ah, as luas e estações que me interferem, maga branca dos infernos. vou ler as cartas de novo, vou tentar não te ver entre os reis. louco, ancião, eremita, morra na torre fulminada.
com mágoas que usam bóias,
uma certa garota.
com mágoas que usam bóias,
uma certa garota.
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