Pesquisar este blog

terça-feira, 7 de julho de 2009

Vida de fotógrafo, falido

Já no oeste, meio bronco, seu Domingos era um cara escondido debaixo do chapelão e do casaco felpudo, a caminhar pelas ruelas de Xanxerê na presença de uma cachorrinha preta, Diana, sua companhia preferida. Apesar da má fama, ele tinha sim uma veia artística, que o impulsionava a apreciar o velho Teixeirinha no rádio, tipo caixão de abelha, e também a tornar-se um dos primeiros fotógrafos da cidade.
A vida de fotógrafo de seu Domingos até rendia um pouco quando havia casórios ou aniversários. Tirava e revelava fotos como sabia, em um tempo de negativos de placas de vidro. Porém, como as pessoas na época não tinham até então o costume de tirar fotografias e algumas nem espelho possuíam, estranhavam-se nas fotos, dizendo que aquelas pessoas eram feias demais para serem elas mesmas, motivo que levou muita gente a simplesmente não pagar pelo serviço. Resultado: o fotógrafo, frustrado, faliu.

Naquela cidade triste
Que chamam de campo santo
Ali deixei certa vez
A mãe que eu amava tanto
Saí no mundo rolando
Eu era tão garotinho
Todos tinham mamãezinha
Só eu, coitado, não tinha
Para me dar um carinho...

(Teixeirinha – Cidade Triste)

Nem essa ou nenhuma das outras atividades que Domingos empenhava-se dava para sustentar devidamente a família. Uma de suas filhas, Loemí, nascera desnutrida, comprida e magricela como um rato e, pouco tempo depois, foi dada como desenganada. Mas eis que quando já segurava desacordada uma vela acesa entre as mãos, em meio às rezas fervorosas dos vizinhos e familiares, a menina despertou em um impulso vital que nunca mais apagou-se, transformando-se no escudo vivo, ainda que falho, de Humberto nos tempos de escola e também depois.
A máquina fotográfica, de panos e tripés, era quase uma relíquia, mesmo que instrumento de fracasso. Mas Domingos um dia a emprestou a um jovem curioso, Ivo Zolet, que queria iniciar-se na arte da fotografia. E ela nunca mais foi vista. Talvez tenha sido trocada por cachaça, talvez não. Daí em diante, seu Município não tiraria mais nenhuma "chapa" sequer.

Nenhum comentário: